
Há muitas estratégias quando o objetivo é reduzir o número na balança. Mas ainda que sigam caminhos diferentes, todas acabam esbarrando em um mesmo princípio: o déficit calórico — ou seja, gastar mais calorias do que se consome.
A ideia é que a partir disso o corpo utilize os estoques — principalmente a gordura corporal — como fonte de energia , diz Páblius Braga, médico do esporte que atua no Hospital Nove de Julho.
O ideal é que esse déficit seja alcançado por meio de uma combinação entre escolhas alimentares saudáveis e prática regular de exercícios físicos. No entanto, dependendo de quantas calorias você deixa de consumir e da qualidade da alimentação, o peso perdido pode não vir apenas da gordura corporal, mas também da massa muscular.
E ter pouca massa muscular pode ser tão nocivo quanto ter excesso de gordura. O metabolismo tende a ficar mais lento, o corpo se torna menos eficiente para queimar gordura e a flacidez pode se acentuar.
Além disso, a perda de músculos compromete a força, a resistência física e a saúde a longo prazo, dificultando a manutenção do peso perdido e aumentando o risco do efeito sanfona .
Por isso, emagrecer com qualidade não é apenas ver o número da balança cair — é preservar o que o corpo tem de funcional e valioso: o músculo , diz Elaine Dias, metabologista e doutora em endocrinologia pela USP (Universidade de São Paulo).
Quando a pessoa está em restrição calórica, o corpo entende que está recebendo menos energia e, como um mecanismo de defesa, entra em modo de economia .
O músculo, por ser o tecido que mais consome energia em repouso, acaba sendo visto pelo corpo como um luxo em tempos de escassez calórica — assim como uma empresa que, em crise, corta os setores mais caros para reduzir custos. O organismo então tende a reduzir a atividade muscular e, se a restrição for muito agressiva ou mal planejada, pode começar a quebrar esse tecido para poupar energia , aponta Dias.
Para preservar o músculo, então, é preciso garantir que ele receba o que precisa.
Cerca de 70% do nosso músculo é água, então é essencial que ele esteja bem hidratado para funcionar corretamente — o que representa em média de 30 ml a 40 ml de água por quilo de peso por dia. Além disso, a água é fundamental para a função celular e a recuperação muscular. Se o músculo estiver desidratado, ele perde volume e eficiência , complementa a médica.
A ingestão adequada de proteína é essencial.
De acordo com Sociedade Internacional de Nutrição e Esporte, para o crescimento muscular e manutenção da massa magra, juntamente com exercícios físicos, é necessária uma ingestão entre 1,4 e 2,0 gramas de proteína por kg diariamente.
Uma pessoa de 70 kg, então, precisaria de um consumo entre 98 e 140 gramas de proteína por dia.
O tamanho do déficit calórico — ou seja, o quanto a pessoa consome a menos do que gasta — também deve ser moderado.
Um déficit de até 500 calorias por dia é geralmente o ideal. Se for muito agressivo, o corpo pode começar a queimar músculo. Um déficit muito grande também pode levar ao efeito sanfona, porque ao perder músculo, o metabolismo fica mais lento , explica a médica.
Para mulheres, que normalmente têm um metabolismo basal (quantidade mínima de energia que o corpo gasta em repouso para manter funções vitais, como respirar e bombear sangue) mais baixo, como aquelas que já têm pouca massa muscular, a recomendação é ser ainda mais cuidadosa.
Nesse caso, 500 calorias a menos pode ser difícil de atingir, e podemos começar com algo em torno de 300 calorias por dia , orienta Dias.
Braga concorda. Existe, sim, um parâmetro seguro, mas depende de um bom balanço, especialmente de proteínas. Um bom exemplo prático seria o tradicional prato brasileiro com arroz, feijão, uma porção de carne ou ovo, e vegetais. É importante que pelo menos um terço da refeição seja composto por fontes proteicas .
Além da alimentação, o exercício físico tem papel central no processo de emagrecimento com preservação de massa magra.
E se a ideia é ganhar músculo enquanto se perde gordura, a escolha dos exercícios importa. Exercícios de força, como a musculação, ajudam a preservar e até aumentar a massa muscular.
Segundo Dias, é natural que o corpo foque em um objetivo por vez: ou perde gordura, ou ganha massa muscular.
No entanto, em alguns casos, especialmente em mulheres pós-menopausa, conseguimos os dois, se a estratégia for bem ajustada.
E manter uma boa quantidade de músculos é tão importante quanto — ou, a depender do caso, até mais — do que ter um baixo percentual de gordura.
Ter massa muscular ajuda a prevenir doenças crônicas como obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão e doenças cardiovasculares, quadros que se tornam mais comuns conforme as pessoas envelhecem.
Por isso os músculos são fundamentais para envelhecer com qualidade. Ele é um órgão endócrino que produz hormônios essenciais para a saúde, como a irizina, que melhora a função cerebral e pode reduzir o risco de diversas doenças, incluindo Alzheimer e Parkinson , conclui Dias.
Outro fator fundamental para preservar a massa muscular é cuidar das emoções.
É essencial que o processo de emagrecimento e melhora da composição corporal não gere estresse adicional. Se a pessoa entra num ciclo de cobrança excessiva, pode acabar prejudicando ainda mais sua saúde , alerta o médico do esporte.
Na avaliação de Braga, o mais importante é alinhar o plano à realidade da pessoa. Horários de treino, rotina de trabalho, tempo de descanso — tudo isso precisa fazer sentido no dia a dia. O resultado precisa vir com qualidade de vida. Esse é o verdadeiro objetivo .